O astrónomo que quer observar determinado objecto recorre aos telescópios existentes nos vários observatórios mundiais. No mundo ideal é fácil .... pega na mochila, põe o necessário para sobreviver durante duas semanas a elevada altitude (roupa quente, pasta de dentes) mais o caderno de observação, compra o bilhete de avião, desloca-se até ao observatório, bate à porta e pode escolher um telescópio à vontade. Seria bom que isto fosse verdade, mas é só nos sonhos que tal acontece. Na realidade, este astrónomo não é o único a querer observar, há mais algumas centenas de outros, e os telescópios disponíveis são poucos. Portanto, um ano antes de poder pegar na mochila, tem de se sentar e pensar três ou quatro vezes sobre o que é que deseja observar, se tal observação é importante e poderá depois contribuir para a compreensão de algo novo na sua área de especialização, quando e como é preferível observar e com que instrumentos, verificar se não houve colegas que já obtiveram dados semelhantes aos que precisa, etc. Depois tem de escrever estes pensamentos duma maneira compreensível num documento, e preencher uma série de papéis para o pedido de tempo de telescópio com instrumento tal, nas noites tais. Envia os papeis para um júri de especialistas e fica a espera do resultado da avaliação. Se o júri aprova a observação proposta, atribui uma ou algumas noites ao astrónomo. Finalmente, pode pegar na mochila e, indo para o observatório, reza para que o tempo esteja bom, pois é preferível não voltar com as mãos vazias e ter de começar tudo outra vez.
Este mês foi assinado um contrato entre 3 instituições: duas universidades americanas, a de Yale e a de Ohio State, e a Universidade de Lisboa. Trata-se duma colaboração para a utilização dum telescópio, baptizado YALO, no Observatório Inter-Americano Cerro Tololo, no Chile. O YALO tem um espelho de 1 metro de diâmetro, o que, nos standards de hoje em dia não se pode considerar grande, mas está equipado com instrumentos de alta tecnologia, e encontra-se num sítio excelente para a observação astronómica. O acesso a este telescópio é um passo muito importante para a astronomia portuguesa professional, porque cada instituição tem 98 noites por ano (!) disponíveis para a sua utilização (ver artigo na pag. 6).
E a nível amador? Um telescópio de 1 metro, para um amador é um "monstro". Que eu saiba só há um, contruído pelo amador belga Danny Cardoen, montado em Puimichel, no sul de França: foi um empreendimento bastante complexo e caro. Pode o astrónomo amador contribuir para a ciência, embora não disponha de instrumentos de qualidade professional, e formação? Pode! Pode porque é uma actividade de que gosta, tem paciência e ... tempo livre. Quantos cometas não são descobertos por amadores, que varrem pacientemente o céu todas as noites ! Durante várias missões espaciais observações regulares dos objectos em questão são essenciais (Giotto/Halley, Galileu/Júpiter, Mars Pathfinder). Observações de ocultações de estrelas pela Lua, ou por asteróides contribuem para a melhor determinação de órbitas, assim como para a determinaçãode tamanhos no caso dos asteróides. Observação de meteoróides informam sobre a distribuição de poeiras no sistema solar. A observação regular de estrelas variáveis, a descoberta de novas ou supernovas, etc., etc.. Também a disponibilidade comercial de CCDs abre novas possibilidades.
Que se continue a manter um bom contacto entre o mundo amador e profissional em Portugal à semelhança de outros países, porque será fértil para ambos os lados.
MR-S