Uma das questões mais fundamentais que o Telescópio Espacial Hubble está a ajudar a esclarecer é a do nascimento e evolução das galáxias. Um dos projectos mais ambiciosos neste domínio consistiu em observar uma pequena região do céu, na constelação da Ursa Maior, durante 10 dias consecutivos, apostando na sensibilidade resultante de uma observação tão longa. O resultado foi a imagem mais detalhada e opticamente mais sensível do Universo até hoje obtida (o Hubble Deep Field - HDF). Na imagem, milhares de galáxias são visíveis, numa profusão de morfologias e detalhes verdadeiramente fascinante. Muitos dos objectos possuem um brilho tão fraco que nunca haviam sido detectados anteriormente e algumas das galáxias são de uma época em que o Universo tinha apenas 10% da sua idade actual. Devido à sua importância, estes dados foram obtidos para a comunidade astronómica internacional e disponibilizados imediatamente após o seu processamento.
Extractos do HDF. Repare-se na diversidade morfológica das galáxias observadas.
As galáxias presentes no HDF mostram (confirmando estudos anteriores mas atingindo luminosidades mais baixas) que o Universo antigo é dominado por galáxias mais pequenas do que as observadas no presente e que a grande maioria das galáxias no passado possui uma morfologia irregular, muitas vezes devido a interacções ou colisões com vizinhas (o que parece ser extremamente comum nessa época). Verifica-se também que a taxa de formação de estrelas nas galáxias aumenta à medida que se recua no tempo, observando-se um máximo há cerca de 9 mil milhões de anos. Houve, portanto, uma evolução na população de galáxias do Universo. Mas que tipo de evolução terá ocorrido? Uma evolução motivada por uma maior taxa de colisões entre galáxias num Universo jovem e consequentemente mais pequeno (uma evolução em densidade)? Ou será que uma elevada taxa de formação estelar é natural nas fases iniciais da vida de uma galáxia, passando ela a formar estrelas a um ritmo mais lento após esse vigor inicial (uma evolução em luminosidade)? Ou será uma mistura de ambas as hipóteses? E de que maneira isto se relaciona com a formação das próprias galáxias? É isto que os astrónomos estão a tentar determinar.
Devido ao sucesso do HDF, o Hubble está a repetir a experiência, desta vez numa zona do céu do hemisfério sul. Esta característica destina- -se a tornar possível o envolvimento de observatórios terrestres neste hemisfério, como o novo VLT, nos estudos paralelos que acompanham (e complementam) esta investigação. As observações principais, que se estenderam ao longo de 14 dias, foram concluídas com sucesso no passado dia 10 de Outubro. A redução dos dados está neste momento a decorrer e as imagens finais, prontas para análise, deverão ser tornadas públicas no dia 23 de Novembro, esperando-se uma grande cobertura por parte dos meios de comunicação social.
Uma das peculiaridades da área do céu escolhida para as observações do HDF-Sul é a presença de um quasar, o que se espera traga novos resultados no estudo destes objectos. Recorde-se que os quasares possuem um tamanho que se estima ser idêntico ao do Sistema Solar mas apesar disso emitem 100 a 1000 vezes mais energia do que uma galáxia com milhares de milhões de estrelas. Os astrónomos acreditam que a fonte de energia dos quasares são buracos negros gigantescos. O problema com este cenário é que é necessário fornecer "comida" suficiente a um destes buracos negros para se conseguir explicar a emissão de tão vastas quantidades de energia. Observações de quasares efectuadas com o Hubble já mostraram que estes objectos se situam no seio de galáxias que muitas vezes apresentam sinais de interacções ou colisões com outras vizinhas, o que poderá explicar a proveniência do material responsável pelo brilho destes objectos. A sensibilidade do HDF-Sul poderá trazer novos desenvolvimentos na caracterização das galáxias onde os quasares residem.
JMA