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Detecção da atmosfera de um planeta extra-solar

Muito antes do início da detecção, em 1995, dos primeiros planetas extra-solares em órbita em torno de estrelas da sequência principal semelhantes ao Sol, pelo método das velocidades radiais, O. Struve propôs, em 1952, que tais planetas se poderiam detectar por meio de medições fotométricas das variações na luminosidade da estrela provocadas pelo trânsito do planeta frente ao disco estelar. A principal desvantagem do método é exigir uma configuração geométrica especial. Com efeito, o eclipse parcial da estrela provocado pelo trânsito de um dos seus planetas só pode ser observado quando o plano da órbita é aproximadamente perpendicular ao plano da esfera celeste. A vantagem do método está no facto de permitir detectar planetas com massas e raios orbitais próximos dos da Terra se se atingirem precisões fotométricas ordem de uma parte em 100000. Contudo, a primeira detecção de um trânsito de um planeta extra-solar foi feita apenas em 2000, por David Charbonneau e independentemente por G. W. Henry na estrela HD 209458, situada a 150 anos-luz na constelação de Pegasus. Este planeta foi descoberto em 1999 pelo método da velocidade radial, ou seja, através da detecção, por meio do efeito Doppler, do movimento orbital da estrela em torno do centro de massa do sistema formado pela estrela e planeta. Trata- -se de um planeta com uma órbita aproximadamente circular com excentricidade de 0.02, com pequeno raio, igual a 0.046 unidades astronómicas, um período de 3.5 dias e uma massa aproximadamente igual a 70 % da massa de Júpiter. É o único planeta extra-solar entre os cerca de 80 já observados, cujo plano de órbita é aproximadamente perpendicular à esfera celeste. Através da análise da curva de variação de luminosidade da estrela durante um trânsito é possível concluir que o raio do planeta é cerca de 1.3 vezes o raio de Júpiter. Com estimativas da massa e do raio obtém-se uma densidade muito baixa de 0.38 gcm-3, inferior à densidade de Saturno, o que indica ser um planeta gigante gasoso predominantemente formado por hidrogénio. Para além de todas estas informações, foi ainda possível, recentemente, fazer a primeira detecção e análise química da atmosfera deste planeta. As observações foram feitas utilizando o telescópio espacial Hubble por uma equipa de investigadores liderada por David Charbonneau do Instituto de Tecnologia da Califórnia e do Centro Harvard-Smithsonian para Astrofísica, em conjunto com Timothy Brown do Centro Nacional de Pesquisa Atmosférica e outros colegas. Durante vários trânsitos sucessivos do planeta, fez-se a análise da luz emitida pela estrela com o espectrómetro do Hubble, o Space Telescope Imaging Spectrograph - STIS. O espectro da estrela é perturbado pela luz que atravessa e é filtrada através da atmosfera do planeta. Comparando o espectro da estrela com o espectro durante um trânsito foi possível identificar a presença de sódio na atmosfera do planeta. Esta técnica de observação é muito promissora porque poderá no futuro ser utilizada na detecção de outros elementos e compostos nas atmosferas dos planetas extra-solares, especialmente de gases característicos de atmosferas capazes de suportar formas de vida semelhantes à que existe na Terra, ou seja, baseadas na química do carbono. A detecção simultânea de H2O e O3 na atmosfera de um planeta extra-solar, que se encontre na zona habitável (intervalo de distâncias à estrela nas quais a água pode existir no estado líquido na superfície dos planetas), é actualmente considerada como reveladora de uma apreciável actividade fotossintética e é, portanto, um indicativo da provável presença de vida nesse planeta. A descoberta de David Charbonneau e do seu grupo abriu, pois, caminho para a observação e análise química das atmosferas dos planetas extra-solares e aproximou-nos um pouco mais da possibilidade de detectar vida extra-terrestre.

Fig. Detecção da atmosfera do planeta extra-solar. O painel superior mostra o trânsito do planeta com a consequente diminuição do brilho da estrela. O painel inferior ilustra a técnica usada para a detecção da absorção do sódio pela atmosfera do planeta. Cortesia NASA. .
Prof. Doutor Filipe Duarte Santos
Faculdade de Ciências, Universidade de Lisboa


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