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Núcleos Galácticos Activos

Os processos físicos que estão na base do aparecimento e evolução da classe de fontes extragalácticas designadas por Núcleos Galáctivos Activos (NGA) são de tal maneira complexos, que ainda não foram compreendidos na sua totalidade pela comunidade astrofísica. Os NGA têm a capacidade de emitir um fluxo de energia por vezes equivalente ao de um aglomerado composto por milhares de galáxias. Ainda mais espantoso que isto é o facto de o fazerem a partir duma região central com dimensões da ordem de 1 parsec(1).

Este fenómeno surpreendente de "superluminosidade" causa-nos alguma estranheza, especialmente se tivermos em conta que os volumes das regiões em causa são bastante pequenos quando comparados com as grandes distâncias a que se encontram de nós. As suas dimensões podem variar entre os kiloparsec e algumas dezenas de kiloparsec. Por outro lado, os seus espectros de radiação apresentam desvios pronunciados para o vermelho, correspondendo a valores de comprimentos de onda superiores, o que nos leva a excluir a possibilidade de os NGA se tratarem de fontes locais.

O "redshift" é um parâmetro físico que quantifica esse desvio. Esta grandeza encontra-se directamente relacionada com a distância a que a fonte se encontra de nós através da chamada Lei de Hubble. Esta lei estabelece que quanto maior fôr a distância a uma determinada fonte, maior será a sua velocidade de recessão devido à expansão do Universo, e, portanto, maior será o seu redshift. Os NGA mais longínquos situam-se a alguns milhares de milhões de anos-luz, ou dito de outra forma, a redshifts de 5.

Face a todo este cenário, o processo físico responsável pelo brilho tão intenso que caracteriza fontes extragalácticas deste género não poderá ser então o da fusão termonuclear que ocorre nas estrelas que constituem as galáxias comuns.

O espectro da região central da maior parte dos NGA apresenta "abas" muito largas para as riscas H alfa e H beta, o que sugere a presença de partículas que se movem a grandes velocidades.

Hoje em dia, há mesmo fortes razões para crer que estas potentes fontes de energia albergam um motor central que consiste num núcleo constituído por um buraco negro de elevada massa. Este pode atingir massas da ordem de 109 massas solares (1 massa solar é aproximadamente igual a 1.99 ×1030 kg), captando gases e poeiras provenientes da galáxia envolvente.

A matéria em queda para o buraco negro forma um disco de acreção, onde partículas sob a forma de plasma são continuamente aceleradas. As leis da Física dizem-nos que os electrões livres que se deslocam com velocidades relativistas sob a acção de campos magnéticos uniformes descrevem uma trajectória helicoidal, emitindo radiação linearmente polarizada numa direcção tangente a esse mesmo movimento.

A radiação que é gerada por meio de todo este processo designa-se por radiação de sincrotrão e explica a emissão contínua dos NGAs. Os fotões criados emitem nas bandas de ultra-violeta e de raios-X, mas depois são dispersados pelos próprios electrões relativistas que os produziram. Grande parte da energia desses electrões é transferida para estes fotões, que vêm aumentar as suas frequências.

Este processo tem o nome de efeito inverso de Compton, e funciona como um mecanismo interno de arrefecimento dos electrões relativistas. Os fotões de altas energias criados escapam à região central do NGA, enquanto que os de baixas energias ficam aprisionados (como os que emitem na banda de rádio).

Para que tudo isto funcione torna-se necessário que haja uma densidade de electrões e fotões suficientemente grande, o que só pode acontecer em estruturas extremamente compactas. De facto, o centro dos NGA é tão denso que se torna opaco à sua própria radiação. A existência de uma estrutura toroidal compacta, composta por gases e poeiras, que envolve o buraco negro e o disco de acreção, confere-lhes precisamente essa opacidade. Os electrões térmicos existentes em redor do buraco negro encarregar-se-ão de reiniciar novamente oprocesso, sucedendo-se tudo de uma forma cíclica.

Actualmente, aceita-se este modelo como sendo o que traduz a explicação mais convincente para a complexa actividade dos NGA com forte emissão em rádio. O resultado final é a emissão de raios-X e de raios-gama.

Fig. Imagem da galáxia activa Centaurus A.
Ao contrário do que talvez se possa pensar, os NGA ainda compreendem um grupo bastante heterogéneo de galáxias. O modelo esquemático que tem tido maior sucesso na procura da unificação de todos os tipos de NGA conhecidos procura essencialmente explicar como as suas propriedades podem variar quase exclusivamente com o ângulo com que eles são observados.

Assim, se observarmosdirectamente a estrutura toroidal compacta do NGA, não vamos conseguir ver a fonte central e teremos diante de nós uma rádio-galáxia com riscas espectrais estreitas ou uma galáxia de Seyfert de tipo 2. Se a linha de visão do observador coincidir com a direcção dos jactos e "virmos" os lóbulos rádio de frente, então teremos um objecto do tipo BL Lacertae que apresenta rápida e acentuada variabilidade de brilho e luz linearmente polarizada. Finalmente, se o NGA fôr observado sob qualquer outro ângulo, teremos um objecto cujas características corresponderão às de um rádio-quasar, às de uma galáxia de Seyfert de tipo 1 ou às de qualquer rádio-galáxia com riscas espectrais largas. Temos contudo de ter sempre presente uma lista das condições físicas inerentes a um modelo que realmente unifique toda uma classe de objectos.

Os NGA podem ser divididos em duas importantes famílias: a das fontes que emitem fortemente em rádio e a das que não emitem praticamente nada em rádio; o que significa que a emissão em rádio é mais intensa que no óptico para as primeiras do que o é para as segundas. As primeiras encontram-se geralmente associados a jactos e a lóbulos que apresentam estruturas em larga escala cuja emissão é feita em rádio, além de raios-X e raios-gama. As suas galáxias anfitriãs são predominantemente elípticas e espirais do tipo precoce. Por outro lado, as fontes fracas em rádio possuem jactos mais ténues que emitem igualmente na banda de rádio mas com menor intensidade. As galáxias que albergam estas últimas são espirais ou lenticulares.

Como já foi referido, tem-se procurado elaborar um modelo que unifique todos os tipos de NGA conhecidos. Pode-se dizer que as características principais que estabelecem as diferenças entre as diversas classes de NGA se prendem directamente com a quantificação da sua actividade; com o facto de apresentarem estruturas variáveis mas mais ou menos simétricas; e em muitos casos, com a possível relação dos dois pontos anteriores com a perspectiva angular do observador terrestre.

Outros aspectos também importantes a focar sempre que se fala de NGA, são: a emissão contínua em rádio-frequências, a massa do buraco negro, a rotação deste, a taxa de acreção de matéria, a morfologia da galáxia que alberga o núcleo central, a interacção com galáxias vizinhas, a formação de jactos relativistas e o comportamento do espectro observado nas diversas regiões em que se podem dividir estas fontes.

Dados os elevados redshifts dos quasares, esta sub-família dos NGA constitui o grupo das fontes que nos permitem recuar mais no tempo. Uma melhor compreensão do funcionamento destes complexos objectos pode permitir-nos preencher algumas lacunas da história do universo físico que nós conhecemos.

Nota (1) - O parsec é uma unidade de comprimento usada em Astrofísica e que corresponde a 3.086 ×1013km.

Dr. João Emanuel Dias
CAAUL, Centro de Astronomia e Astrofísica da Universidade de Lisboa



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