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FANTÁSTICAS E MISTERIOSAS NUVENS
Nuno santos
CAAUL/OAL

   As nebulosas, enormes nuvens de gás e poeira que pairam no espaço (quase) vazio entre as estrelas, são um dos objectos celestes mais impressionantes. No entanto, alguns destes corpos encerram dentro de si uma história cujos detalhes nem sempre são bem conhecidos. Agora, uma equipe de astrónomos belgas e americanos obteve imagens de algumas nebulosas nas nuvens de Magalhães. Estas imagens permitiram resolver um dos grandes mistérios que estas nuvens encerravam: a razão de serem tão quentes.
   Do ponto de vista astrofísico existem vários tipos de nebulosas. Dependendo da temperatura a que se encontram, e da quantidade de radiação a que estão sugeitas, estas podem apresentar diversos aspectos, brilhos e cores. Algumas destas (tal como a que se pode ver na imagem) são denominadas de "emissão", um nome que provém do facto de esta classe de objectos emitir a luz em comprimentos de onda (cores) bem definidos. Esta radiação é na realidade produzida pelos átomos e iões dos vários elementos químicos existentes na nebulosa (outro exemplo de uma nebulosa de emissão é a imagem na capa deste número).

Imagem de uma nebulosa de emissão obtida com o auxílio da câmara FORS1, num dos telescópios do VLT (ESO, Chile). As diferentes cores indicam a presença de diferentes elementos químicos: o azul é emitido por iões de hélio, o verde por iões de oxigénio, e o vermelho por átomos hidrogénio. Cortesia do ESO.

   Mas para que um átomo possa emitir luz, é necessário reunir uma série de condições. Em particular, a nebulosa tem de ser aquecida por uma fonte de energia exterior capaz de excitar os átomos. Estes, quando mais tarde voltam ao estado dito de "fundamental", vão reemitir radiação em comprimentos de onda típicos, que nos permitem determinar (entre outras grandezas) a composição química da nebulosa.
   Mas qual é a fonte de energia que está por detrás desta emissão? Se na maior parte dos casos não restam dúvidas, noutros esta não é ainda conhecida. Em particular, existem nebulosas de emissão cujo gás parece estar extremamente quente e excitado. Isto só é possivel se estiverem associadas a uma fonte de energia muito potente. Mas qual?
   Para desvendar este mistério, uma equipe de astrónomos belgas e norte-americanos obteve imagens de rara beleza de algumas destas nuvens misteriosas utilizando um dos telescópios do VLT (do Observatório Europeu do Sul - ESO), instalado no deserto do Atacama, no Chile.
   As magníficas imagens permitiram verificar que pelo menos 3 destas nuvens se encontram associadas a algumas das estrelas mais quentes que se conhecem até hoje: as chamadas estrelas de tipo "O". Estes "sóis", que têm massas superiores a 20 vezes a do nosso Sol, são extremamente quentes, azuis, e brilhantes (podem ser mesmo 10 milhões de vezes mais brilhantes que o nosso Sol, já que a sua superfície atinge dezenas de milhares de graus centígrados). É justamente a radiação ultra-violeta produzida por estas estrelas que está a aquecer as nebulosas.
   A presença de estrelas de tipo "O" na vizinhança destas nuvens tem também outra consequência. Estas emitem grandes quantidades de gás em poderosos "ventos estelares", que ao chocar com o material da nebulosa a vão moldar. Desta forma, estas nebulosas apresentam frequentemente estruturas semelhantes a cavidades.

 
ANDRÓMEDA: UM PASSADO MISTERIOSO
José Afonso
CAAUL/OAL

   Fazendo uso das imagens mais profundas até hoje obtidas com o telescópio espacial Hubble, uma equipa de astrónomos observou o halo da galáxia de Andrómeda. Ao invés de identificarem essencialmente estrelas muito antigas, com cerca de 12 mil milhões de anos, como acontece na Via-Láctea, descobriram uma fracção apreciável de estrelas relativamente jovens, com idades compreendidas entre os seis e os oito mil milhões de anos. A diferença de idades entre os halos destas duas galáxias pode indicar um passado mais "canibalistico" da nossa vizinha Andrómeda.
   A galáxia de Andrómeda é muito parecida com a Via-Láctea, sendo ambas galáxias espirais relativamente "serenas" (sem buracos negros activos ou formação de estrelas intensa). A parte mais activa destas galáxias está situada no seu disco, onde gás e poeira se distribuem e fornecem, nas zonas mais densas, as condições apropriadas para a formação de estrelas. O halo é uma zona esférica, pouco densa, que inclui o disco, estendendo-se muito para além deste. Pouco denso e sem muito gás, não possui as condições necessárias para a formação de estrelas. Nele podemos encontrar estrelas idosas, prováveis

A galáxia Andrómeda e, a verde, a pequena região do seu halo agora observada com o telescópio espacial Hubble. Aqui, 300 000 estrelas revelam o passado canibalesco da nossa vizinha cósmica.
Cortesia Bill Schoening, Vanessa Harvey / REU program / NOAO / AURA / NSF.

remanescentes da formação da própria galáxia. A pobreza destas estrelas em elementos pesados (metais, na gíria astronómica, produzidos no interior de estrelas ou em explosões de supernova), identifica-as como estrelas "primitivas" e separa-as claramente das estrelas do disco galáctico. Na Via-Láctea, a idade típica destas estrelas situa-se entre onze e treze mil milhões de anos.
   No caso de Andrómeda, porém, a situação parece ser diferente. Após uma observação de 3.5 dias de uma região periférica da galáxia (ver figura), o telescópio espacial Hubble e a sua câmara ACS revelaram cerca de 300.000 novas estrelas. Cerca de dois terços destas estrelas são muito semelhantes às estrelas idosas que povoam o halo da Via-Láctea. No entanto, o terço restante possui uma metalicidade (a quantidade de elementos pesados) muito superior, o que implica uma origem posterior para estas estrelas. A idade estimada encontra-se entre 6 e 8 mil milhões de anos. Não havendo material adequado para a formação destas estrelas no halo galáctico, elas devem pois ter-se formado noutro local...
   Os astrónomos sugerem três cenários que, isoladamente ou em conjunto, podem explicar a origem desta população estelar: a galáxia de Andrómeda pode ter colidido com outra galáxia no passado tendo dispersado parte do seu disco jovem pelo seu próprio halo; uma colisão com uma galáxia vizinha pode ter destruído esta última, havendo depois a dispersão das suas estrelas pelo halo de Andrómeda; ou uma colisão pode ter espalhado gás pelo halo de Andrómeda que posteriormente teria formado estas estrelas.
   Qualquer destas alternativas aponta para um passado de Andrómeda algo cataclismico e, aparentemente, mais activo que o da Via-Láctea. Curiosamente, a nossa Galáxia encontra-se ligada gravitacionalmente a Andrómeda e estima-se que dentro de alguns milhares de milhões de anos, já após o Sol ter terminado a sua vida, ambas irão colidir... será a Via-Láctea a próxima grande refeição da "canibal" Andrómeda?