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* Novas visões do centro da Via-Láctea
4* Uma iniciação ao universo dos Telescópios 5 6* Para Observar em Fevereiro
  VISIBILIDADE DOS PLANETAS
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(Versão do Boletim em PDF)

O Telescópio Espacial Hubble e o seu Sucessor
Parte I


Imagem do telescópio espacial Hubble com a Terra como plano de fundo. Cortesia: NASA.

Desde que Galileu olhou pela sua luneta para a Lua, em 1609, que os telescópios se tornaram uma das ferramentas mais importantes no estudo do Universo. Com o passar do tempo e a evolução da capacidade tecnológica humana, os telescópios foram-se tornando cada vez mais precisos e "poderosos" . O "poder" de um telescópio reside na sua capacidade de recolha de luz, quanto maior a dimensão do elemento principal de recolha de luz de um telescópio (o espelho primário, no caso dos telescópios reflectores), maior o detalhe com que os objectos podem ser visualizados. Devido a este factor, os telescópios foram-se tornando cada vez maiores. Porém, a atmosfera terrestre absorve e distorce a luz proveniente dos objectos celestes, deteriorando a qualidade de observação destes. Foi com base neste problema que surgiu a ideia de colocar um telescópio em órbita da Terra, onde as observações pudessem ser realizadas sem a interferência negativa da atmosfera.

Em 24 de Abril de 1990, a bordo da nave espacial Discovery, um poderoso instrumento científico, resultado de um esforço conjunto entre a NASA e a ESA, dava início a uma nova etapa no estudo do Universo, que viria a revolucionar a visão humana do mesmo - o telescópio espacial Hubble. O nome deste telescópio surge em homenagem ao astrónomo Edwin Powell Hubble que, em 1929, estabeleceu a relação entre a distância de uma galáxia e a velocidade com que esta se afasta da Terra: quanto mais longínqua a galáxia, maior a velocidade com que esta se afasta. Esta noção forneceu a base da teoria de formação do Universo mais aceite nos dias de hoje, o Big Bang.

O Hubble está colocado em órbita da Terra, a 569 km da superfície, e viaja à velocidade de 7,5 km/s. Com 13,2 metros de comprimento e um diâmetro máximo de 4,2 metros, este telescópio tem aproximadamente as dimensões de um autocarro, pesando cerca de 11 110 kg. Apesar da sua envergadura e da velocidade estonteante com que se movimenta, o Hubble possui uma enorme estabilidade e precisão, sendo capaz de fixar um objecto sem se desviar do seu alvo mais do que 0,007 segundo-de-arco, a largura de um cabelo humano visto à distância de 1,5 km. É esta precisão, associada à sua tremenda capacidade de resolução (0,05 segundo-de-arco), que torna o Hubble um instrumento tão poderoso em Astronomia. Se a visão do leitor possuísse o poder de resolução do Hubble, conseguiria distinguir a partir de Lisboa, duas moscas separadas por um metro, estando estas em Moscovo.

Pouco tempo após a sua entrada em funcionamento, as imagens enviadas pelo telescópio mostravam que havia um sério problema no sistema óptico. Embora as primeiras imagens recebidas fossem aparentemente mais nítidas que as obtidas com telescópios terrestres, não era possível atingir uma focalização precisa, e por isso as imagens ficavam muito aquém do que se esperava. Depois de analisado o problema, concluiu-se que o espelho primário continha um defeito, sendo esta imperfeição da ordem dos micrómetros (a milionésima parte do metro). O problema foi solucionado acrescentando dois espelhos ao telescópio de modo a corrigir por completo a imperfeição no espelho primário.

Todas as semanas, o Hubble fornece cerca de 120 gigabytes de dados, o que equivale a uma enciclopédia completa por dia. Com mais de 400 mil observações realizadas, o Hubble estudou mais de 25 mil objectos, providenciando dados para milhares de artigos científicos.

Tendo aberto as portas para uma nova visão em diversas áreas tais como a cosmologia, formação estelar e formação galáctica, este instrumento é sem dúvida um dos maiores triunfos tecnológicos da humanidade. Entre as inúmeras contribuições do Hubble que culminaram numa compreensão mais profunda do Universo, encontram-se:

  • permitiu aos astrónomos observar as profundezas do espaço e do tempo, fornecendo uma ideia acerca dos primeiros passos da formação galáctica;
  • teve um papel importante na história e evolução da matéria no Universo, permitindo aos astrónomos ter uma boa ideia da quantidade e composição dessa matéria;
  • forneceu evidências da existência de buracos negros passando estes objectos da teoria para realidade;
  • teve um papel importante na área da formação estelar, permitindo uma melhor compreensão e estudo de como estes corpos evoluem.

Estando há quase 16 anos ao serviço da comunidade científica, a jornada do primeiro telescópio espacial está a chegar ao fim. A sua saída de serviço está prevista para 2011 (ou mesmo antes caso uma missão de manutenção não seja possível este ano), altura em que será colocado em órbita o seu sucessor, o telescópio espacial James Webb. O Hubble certamente terá um fim, mas o seu legado persistirá como parte integrante da visão e compreensão do Universo.


João Retrê
© 2006 - Observatório Astronómico de Lisboa