Um problema cosmológico resolvido?
O estudo de um conjunto de estrelas do enxame globular NGC6397 parece mostrar que as abundâncias dos vários elementos presentes na atmosfera de uma estrela pode diminuir ao longo do tempo devido a processos de sedimentação. A confirmar-se, este resultado resolve uma importante discrepância existente entre a abundância de lítio observada em estrelas muito antigas e os valores previstos pela teoria do Big-Bang.
Imagem do enxame globular NGC6397. Este enxame encontra-se a cerca de 7200 anos-luz da Terra na direcção da constelação da Ara (Altar). Cortesia do ESO.
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Segundo os modelos actuais, o Big-Bang terá dado origem a grandes quantidades de hidrogénio, um pouco de hélio, e alguns pozinhos de outros elementos. Entre estes últimos encontra-se o lítio. Se for possível medir a quantidade de lítio existente em estrelas muito antigas, que se formaram pouco após o Big-Bang (ou seja, a partir de material pouco ou nada contaminado pelo material ejectado por anteriores gerações de estrelas), podemos assim tentar comparar com os valores que os modelos prevêm, e testar as teorias actuais. Em particular, segundo os modelos espera-se que a quantidade relativa de lítio produzido no Big-Bang esteja intimamente ligada à quantidade total de matéria produzida, algo que foi recentemente estimado usando estudos da radiação cósmica de fundo.
No entanto, a medição das abundâncias de lítio em estrelas muito velhas da nossa galáxia parecia mostrar um desacordo em relação aos valores esperados pelos modelos de nucleossíntese primordial. Estes previam abundâncias deste elemento 2 a 3 vezes superiores às efectivamente observadas. Será que o problema pode estar na teoria do Big-Bang, ou será que os valores das abundâncias medidas nas estrelas podem não reflectir o valor da abundância de lítio inicial? Um estudo realizado por uma equipa europeia de astrofísicos parece ter dado agora a resposta a esta questão. Os astrofísicos utilizaram o espectrógrafo FLAMES acoplado a um dos grandes telescópios do VLT (ESO) para obter espectros de estrelas do velho enxame globular NGC6397. As estrelas observadas encontram-se em diferentes fases de evolução.
Um estudo realizado por uma equipa europeia de astrofísicos parece ter dado agora a resposta a esta questão. Os astrofísicos utilizaram o espectrógrafo FLAMES acoplado a um dos grandes telescópios do VLT (ESO) para obter espectros de estrelas do velho enxame globular NGC6397. As estrelas observadas encontram-se em diferentes fases de evolução.
A análise dos espectros mostrou que as abundâncias dos vários elementos estudados variam de estrela para estrela consoante a fase evolutiva em que esta se encontra. Nas estrelas da sequência principal (SP; estrelas semelhantes ao Sol) os valores são inferiores aos encontrados em estrelas gigantes, em estágios evolutivos mais avançados. Esta variação é interpretada como resultado da sedimentação dos elementos pesados para o interior da estrela sob a acção da gravidade estelar, um processo que se dá durante o longo período em que a estrela passa na SP. Quando a estrela sai dessa fase e se transforma progressivamente numa estrela gigante o material volta a misturar-se, repondo as abundâncias iniciais.
Os modelos que explicam as abundâncias observadas nas estrelas do NGC6397 indicam também que o mesmo processo se deve dar com o lítio. Assim, é provável que as abundâncias observadas em estrelas muito antigas nos dêm valores inferiores aos reais. Se descontarmos o efeito da sedimentação, os valores observados nas estrelas parecem de facto coincidir com o esperado pela teoria do Big-Bang.
Nuno Santos
CAAUL/OAL
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A génese da Via-Láctea
Observações detalhadas de estrelas, com o Very Large Telescope (VLT), do ESO, estão a revelar a história da Via-Láctea, uma galáxia em que a parte central se formou muito rapidamente e muito antes do próprio disco.
Uma região do céu na direcção do bojo Galáctico, onde as estrelas se terão formado independentemente, e muito mais rapidamente, que as estrelas do disco (onde se situa o Sol). No canto inferior esquerdo é visível o enxame globular NGC 6528. A imagem é uma composição de imagens obtidas com o instrumento FORS do VLT. Cortesia: Henri Boffin e ESO.
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Este conjunto de (muitas) estrelas que inclui o Sol, a Via-Láctea, é uma galáxia espiral, com um núcleo esferóide (bojo) de onde partem braços ricos em estrelas, gás e poeira. Entre as estrelas dos braços espirais encontram-se representantes de todas as idades, mas no bojo existem essencialmente estrelas muito velhas, com mais de 10 mil milhões de anos, possivelmente remanescentes da formação da própria Galáxia.
Com o objectivo de estudar a formação da Via-Láctea, uma equipa de astrónomos utilizou o Very Large Telescope para obter espectros detalhados de 50 estrelas gigantes situadas no bojo da Galáxia. A análise destes dados permitiu-lhes determinar com grande precisão a composição química destas estrelas o que revela o enriquecimento do material interestelar na altura da sua própria formação. Ora, este enriquecimento depende da formação estelar anterior, pelo que se torna possível distinguir em diferentes grupos de estrelas.
A equipa de investigadores, comparando as abundâncias de oxigénio - produzido principalmente na explosão de estrelas de grande massa e de vida curta, em explosões de supernova tipo II - com as abundâncias de ferro - produzido em grande parte em supernovas tipo Ia, que nascem da acumulação de material em torno de uma anã branca, num processo muito mais demorado - nas estrelas estudadas, conseguiram mostrar que, para uma mesma quantidade de ferro, as estrelas do bojo possuem muito mais oxigénio que as estrelas no disco. Concluíram assim que as estrelas do bojo não se formaram no disco, migrando depois para a parte central da Galáxia, mas que se formaram independentemente das estrelas do disco e muito mais rapidamente que estas últimas.
Os modelos teóricos apontam para um bojo que se terá formado em menos de mil milhões de anos, muito provavelmente através de uma série de eventos de formação estelar intensa, quando o Universo tinha apenas uma fracção da sua idade actual.
José Afonso
CAAUL/OAL
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