Ao tempo do império, os romanos deixaram-se seduzir pela força e beleza dos mitos gregos, mas, não querendo admiti-lo, deram-lhes os nomes dos seus próprios mitos, pois para um povo belicoso era vergonha os conquistadores fazerem sua a cultura dos derrotados. Para os romanos Cronos tornou-se Saturno, Zeus ficou Júpiter, Ares, Afrodite e Hermes vieram a ser Marte, Vénus e Mercúrio. Para os antigos, os deuses habitavam na Natureza e podiam tomar numerosas formas, por isso não lhes era difícil acreditar que aqueles pontos de luz que se movem através do céu todas as noites, os planetas, que em grego significa "estrelas viajantes", fossem deuses.
Em 1655, Christiaan Huygens fazendo observações de Saturno, notou uma pequena mancha que, de noite para noite, parecia mover-se sobre o planeta. Sabendo que, 45 anos antes, Galileu havia descoberto quatro satélites em Júpiter, Huygens identificou o que via como um satélite e determinou o seu período de revolução em torno de Saturno.
Pouco depois de Galileu ter anunciado a sua descoberta, um outro astrónomo, Simon Marius, reclamou ter também observado os satélites de Júpiter algumas semanas antes de Galileu. Marius conta que, num encontro com Johannes Kepler, este lhe sugeriu que nomeasse os satélites que descobrira em Júpiter segundo quatro personagens mitológicas, por quem Zeus se havia apaixonado nos poemas de Hesíodo. Três princesas chamadas Europa, da cidade libanesa de Sídon, Calisto, da Arcádia, e Io, de Argos; e um príncipe, Ganímedes, de Tróia, que Zeus, transformado em águia, raptou e levou para o Olimpo.
Uma vez que naquela época ainda muito poucos satélites eram conhecidos, os astrónomos mantiveram o sistema galileano de referir cada lua individualmente por um número - I, II , etc. Contudo esta denominação numérica tornou-se cada vez mais confusa à medida que mais satélites eram descobertos. Em 1847 eram já conhecidos sete em Saturno, quando o inglês John Herschel propôs que fossem adoptados nomes mitológicos para os sistemas de satélites, à semelhança do que já se fazia com os planetas. Assim a antiga sugestão de Kepler foi finalmente aceite. Por outro lado, o satélite descoberto por Huygens em Saturno era o maior até então conhecido em todo o sistema solar. Por isso Herschel decidiu chamar-lhe Titã, e às restantes luas do planeta deu-lhes os nomes dos titãs e titãnias mitológicos, irmãos de Cronos.
Sabemos hoje que Titã, com 5150 km de diâmetro, não é de facto o maior, mas o segundo maior satélite do sistema solar, sendo apenas ultrapassado no tamanho por Ganímedes, que tem 5262 km de diâmetro. No entanto, durante muito tempo pensou-se que Titã era o maior satélite. A razão é admiravelmente simples, mas está longe de ser evidente. Titã tem uma atmosfera, e esta é tão opaca que não deixa ver a superfície. Assim, o que os astrónomos vêem através do telescópio óptico, é o limite da atmosfera, a uma altitude de 350 km. Em Ganímedes não existe uma verdadeira atmosfera, apenas uma finíssima camada de ozono, por esse motivo o observador inadvertido facilmente se deixa enganar pensando que Titã é o maior.
Não exagero ao dizer que, depois de todos os avanços que a tecnologia trouxe à astronomia, Titã permanece um dos objectos mais enigmáticos e fascinantes do sistema solar. Sabemos da existência de 18 satélites em Saturno, com diâmetros que vão desde uns modestos 20 km de Pan, o mais pequeno, até à enormidade de Titã, ele próprio maior que o planeta Mercúrio. No entanto a existência de uma atmosfera em Titã e as questões que isso levanta foram uma das principais razões para as agências espaciais europeia e americana terem decidido avançar para o sistema de Saturno com a missão Cassini-Huygens, um módulo orbital que estudará Saturno e as suas luas, acoplado a uma sonda de descida que será lançada sobre Titã no fim do ano 2004. As observações da missão são ansiosamente esperadas por uma multidão de cientistas de todas as áreas das ciências planetárias. Durante a fase de aproximação, quando a antena de 4 metros começar a emitir para a Terra as primeiras fotografias de Febe, a lua mais externa do sistema saturniano, talvez então possamos olhar à luz da ciência para estes outros Titãs há muito perdidos no caos do desconhecido.
Dr. David Luz Observatório Astronómico de Lisboa, FCUL