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Vinte e Quatro Horas num Observatório Astronómico - II

As equipas de técnicos e engenheiros que trabalharam desde manhã cedo nos três telescópios do "Isaac Newton Group", no observatório astronómico "Roque de Los Muchachos" em La Palma, no arquipélago das Canárias, terminaram já os seus afazeres, deixando os telescópios completamente operacionais. A última actividade do dia, antes da entrega de cada um dos telescópios aos cuidados do astrónomo visitante, consiste na preparação final dos instrumentos que vão ser utilizados. No telescópio Jacobus Kapteyn (JKT), onde o único instrumento disponível é uma câmara para obtenção de imagens de objectos celestes, um astrónomo do observatório trata de limpar e colocar na roda de filtros da câmara os filtros necessários para as observações que vão ser efectuadas durante as próximas noites. Nos telescópios Isaac Newton (INT) e William Herschel (WHT) os instrumentos a utilizar serão espectrógrafos. A preparação destes consiste na focagem e no correcto alinhamento do detector a utilizar. Uma vez executadas estas últimas mas importantíssimas tarefas, os telescópios e os instrumentos necessários para as observações estão prontos a serem utilizados. Ao contrário do que se possa pensar, uma noite de observações tem o seu início ainda durante o dia. É necessário obter um conjunto de imagens de calibração que serão utilizadas durante a fase de tratamento de imagem que se segue ao período de observações. São essencialmente dois os tipos de imagens de calibração: imagens de uma fonte luminosa espacialmente uniforme, designadas pela expressão inglesa "flat-fields" e espectros de um gás conhecido, designados por espectro de "Arco". As primeiras são fundamentais qualquer que seja o tipo de observações efectuadas, enquanto que os segundos são apenas necessários para observações espectroscópicas. Os "flat-fields" destinam-se a corrigir diferenças de sensibilidade à luz de uma região do detector para outra, enquanto que os espectros de "Arco" são utilizados para estabelecer a escala de comprimento de onda nos espectros observados. Assim, antes de qualquer noite de observações, encontramos sempre os astrónomos a obter as suas imagens de calibração, deixando tudo preparado para as observações dos objectos celestes. Em qualquer telescópio de um observatório astronómico, o modo como se efectuam as observações é semelhante. Hoje em dia tudo é controlado por "software" através de sofisticados computadores. São três os sistemas essenciais: o sistema de controlo do telescópio (TCS); o sistema de controlo do instrumento, seja ele uma câmara ou um espectrógrafo (ICS) e o sistema de aquisição de dados (DAS), que controla o detector de radiação e o modo como os dados digitais são armazenados. Os sistemas de controlo do instrumento e o de aquisição de dados estão intimamente ligados. No JKT, o astrónomo visitante opera os três sistemas de controlo. Para observar um dado objecto, o astrónomo começa por inserir as coordenadas celestes daquele no TCS, ordenando, em seguida, que o telescópio move para a posição desejada. Uma vez atingida a posição do objecto no céu, o telescópio inicia um movimento que compensa o movimento de rotação da Terra, mantendo o objecto no centro do campo de visão. Este movimento do telescópio é eficaz mas, de um modo geral, pouco preciso. Para aumentar a precisão com que o telescópio aponta para um dado objecto, o astrónomo pode utilizar um dispositivo denominado por "auto-guider". Este, utiliza estrelas relativamente brilhantes localizadas nas proximidades do objecto a estudar para manter a pontaria do telescópio com grande precisão. Uma vez accionado o "auto-guider" pode-se iniciar a observação. Agora, através do ICS o astrónomo escolhe o filtro que pretende utilizar e com o auxílio do DAS inicia a exposição, que durará o tempo necessário. No final da exposição a imagem é armazenada digitalmente para mais tarde ser tratada e analisada. Se necessário, obtêm-se imagens através de outros filtros e repete-se o processo para o número de objectos desejado. As imagens obtidas podem ser vistas num ecrã de computador utilizando "software" adequado. A operação do TCS no INT e no WHT é deixada a cargo de um empregado especializado do observatório, enquanto que o ICS e o DAS são controlados pelo astrónomo visitante. O processo é análogo ao descrito para o JKT, apenas um pouco mais complexo por se tratarem de telescópios maiores e por terem um maior número de instrumentos disponíveis. Após apontar o telescópio para o objecto a estudar e accionar o "auto-guider", o astrónomo pode operar o ICS de modo a obter as imagens ou os espectros que deseja, utilizando a configuração do instrumento mais adequada aos fins que tem em vista. Observando vários objectos, observando o mesmo objecto com diferentes configurações instrumentais ou mesmo fazendo observações idênticas de um só objecto para estudar variações com o tempo, decorre mais uma noite nos telescópios de La Palma. De modo análogo, suceder-se-ão muitos outros dias e noites no observatório do "Roque de Los Muchachos", sempre com o objectivo de levar o conhecimento mais além.

Doutor Daniel F. M. Folha

Centro de Astrofísica da Universidade do Porto e Isaac Newton Group



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