O mecanismo de formação dos grãos de poeira ainda não é totalmente entendido. No entanto, da comparação de modelos teóricos com observações resulta a interpretação que as poeiras se formam em torno de estrelas gigantes que deixaram a sequência principal (ver O Observatório, vol.6, n 1, pág.5) e se encontram a perder massa. É nos ventos destas estrelas que se formam pequenos núcleos sólidos de material refractário, essencialmente silicatos e material carbonáceo. Esses grãos são ejectados para o meio interestelar, onde passam umas dezenas de milhões de anos expostos a condições extremas: radiação de elevada energia, bombardeados por partículas altamente energéticas, submetidos a elevadas variações de temperatura e a choques, enquanto circulam por zonas de maior ou menor densidade.
A certa altura, um grão de poeira acaba por se encontrar numa nuvem molecular. Aí, onde a temperatura é baixa, cerca de 10 K (graus Kelvin Celsius) e protegidos das condições difíceis do meio interestelar, os grãos de poeira ficam cobertos de gelos. Essas coberturas geladas são verdadeiros "cocktails" de moléculas: água (HO), monóxido de carbono (CO), dióxido de carbono (CO) e metanol (CHOH) são as moléculas mais abundantes nos gelos, embora outras moléculas - como OCS, CH e SO, entre outras - tenham sido identificadas como constituintes menores.
Nem todos os gelos se acumulam da mesma forma nos grãos e nem todos podem sobreviver em todas as zonas e fases de uma nuvem molecular. A água no estado sólido é o gelo, que parece estar sempre presente numa nuvem molecular. Pensa-se que a sua formação nas coberturas geladas ocorre através de reacções químicas entre átomos de hidrogénio e oxigénio que se depositam do estado gasoso na superfície do grão, durante uma fase da evolução da nuvem em que a densidade ainda é relativamente baixa. A temperatura de sublimação do gelo de água é de cerca de 100 a 150 K, nas condições destas nuvens, pelo que esse gelo pode sobreviver mesmo que a temperatura atinja as dezenas de graus Kelvin (como, por exemplo, nas zonas exteriores das nuvens moleculares).
À medida que a densidade vai aumentando e nas zonas interiores das nuvens, os gelos que se formam vão sendo cada vez menos ricos em hidrogénio. Ao mesmo tempo, a temperatura vai baixando, o que torna possível o depósito directo do gás sobre a superfície do grão (sublimação) de moléculas muito voláteis como o CO (que, no seu estado puro, sublima a cerca de 10 K).
Como resultado, as coberturas geladas dos grãos um grau elevado de segregação (ver figura junta): a primeira camada que se forma sobre o núcleo é constituída sobretudo por HO com mistura de outras moléculas polares ricas em hidrogénio; mais para o exterior do grão, os gelos presentes são cada vez mais pobres em H, com mistura de moléculas apolares; a camada exterior dos grãos nas zonas mais frias e protegidas de uma nuvem é constituída por moléculas muito voláteis e apolares.
Fig. Representação esquemática de um grão de poeira, efectuando trocas com o gás e sujeito à radiação por raios-X e ultravioleta e ao bombardeamento por partículas altamente energéticas.Mesmo numa nuvem molecular, os grãos de poeira estão sujeitos a variações de temperatura, à irradiação por raios-X e ultravioleta das jovens estrelas em formação nas nuvens moleculares, e ao bombardeamento por partículas energéticas que penetram as nuvens. Tudo isso conduz à alteração da estrutura e composição dos gelos que pode ser estudada por observações no infravermelho.
Doutora Teresa C. Teixeira
Instituto de Física e Astronomia, Univ. Århus, Dinamarca