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As galáxias de Seyfert (cont.)

III. As teorias actuais:

Presença de um buraco negro super massivo

Como descrito no primeiro artigo desta série, a largura das riscas observadas no espectro das galáxias de Seyfert permite estimar a velocidade do gás emissor como sendo de algumas dezenas de milhares de quilómetros por segundo. Tais velocidades pressupõem a presença de um corpo extremamente massivo, que acelere o gás por meio da atracção gravitacional. Observações permitiram estimar, para certas galáxias de Seyfert, a massa deste corpo, para a qual se deduziram valores que são da ordem de 10 a 100 milhões de vezes a massa do Sol. Esta massa deve, para além disso, estar confinada num volume muito pequeno, como atestam as variações rápidas de brilho observadas em alguns objectos. Várias teorias foram elaboradas sobre a natureza deste corpo massivo e compacto e aquela que é aceite actualmente (modelo standard) supõe a existência de um buraco negro(1) gigante. Em tal caso, o gás e as estrelas que o rodeiam sofrem a sua atracção e aproximam-se dele progressivamente. Pode-se demonstrar que, durante esta aproximação, o gás forma um disco em rotação em torno do buraco negro (que se denomina disco de acreção), tal que a velocidade de rotação aumenta muito rapidamente à medida que a distância ao buraco negro diminui. Devido ao atrito entre as partículas do gás, este aquece, atingindo temperaturas extremamente elevadas que justificam a radiação ultravioleta que se observa.

Deste modo, o modelo habitualmente aceite hoje, é composto por um buraco negro super massivo rodeado por um disco de acreção e por nuvens de gás ionizado que se movem aleatóriamente no poço de potencial do buraco negro (ver Figura). Embora a natureza destas nuvens não seja conhecida, elas poderiam ser provenientes de envelopes de estrelas inchados pela forte radiação do AGN.

Este modelo geral não permite, contudo, descrever todas as observações nem compreender, nomeadamente, a origem da forte radiação X e gama ou explicar as fortes variações registadas. Modelos teóricos mais complexos (mantendo no entanto, em geral, a ideia de um disco de acreção em torno de um buraco negro) tentam responder a estas questões embora nenhum seja actualmente inteiramente satisfatório.

O modelo de unificação

Foi já mencionado que as galáxias de Seyfert se caracterizam pela presença, no seu espectro óptico, de intensas riscas de emissão mais ou menos largas que permitem distinguir entre Seyferts de tipo 1 e tipo 2. Pensa-se que as riscas largas são emitidas numa região próxima do centro da galáxia onde a atracção do buraco negro justificaria as elevadas velocidades do gás. Esta região denomina-se BLR (Broad Line Region na nomenclatura inglesa correntemente usada) ou região de riscas largas - ver Figura. Pode-se estimar o tamanho aproximativo da BLR a partir da variabilidade das riscas largas e dos diferentes tempos de resposta a uma variação da radiação central, tipicamente entre 10 e 100 dias-luz. A NLR (acrónimo inglês para Narrow Line Region), região de emissão de riscas estreitas, situar-se-ia muito mais longe do núcleo da galáxia. A não variabilidade destas riscas estreitas sugere um tamanho para a NLR de alguns anos-luz.

Como se explicou anteriormente, é possível que as Seyfert 2 sejam mais obscurecidas pela presença de poeiras nas suas regiões centrais que as Seyfert 1. Esta hipótese foi, aliás, avançada para explicar a diferença espectral entre Seyfert 1 e Seyfert 2. O núcleo central da galáxia, assim como a BLR, tornam-se de facto invisíveis para o observador se a matéria absorvente se encontrar na sua linha de visão. Nesse caso só se consegue observar a NLR (situada no exterior relativamente às zonas de absorção), tendo então a galáxia todas as características de uma Seyfert 2 (ver Figura). A este modelo, que tenta unificar os dois tipos de Seyfert num só objecto, chamou-se modelo de unificação. Ele sugere também que a poeira se encontra repartida sob a forma de um toro em torno do objecto central. A diferença entre Seyfert 1 e 2 explica-se então simplesmente por um ângulo de inclinação diferente entre o eixo do toro e a linha de visão do observador (ver Figura): no caso de pequenos ângulos de inclinação, observam-se directamente as regiões centrais (portanto a BLR) e detectam-se riscas de emissão largas (caso de uma Seyfert 1). Para grandes ângulos de inclinação, a linha de visão encontra o toro de poeiras e a BLR torna-se por isso invisível para nós. Neste caso, apenas a NLR é observada (caso de uma Seyfert 2).

Conclusão

Um grande número de questões relativas às galáxias de Seyfert estão ainda sem resposta. Porque serão elas maioritariamente espirais? Estará correcto o modelo de unificação? De onde provém a radiação X? Como explicar a rápida variabilidade destes objectos? Numerosos trabalhos tentam actualmente responder a estas perguntas, sendo através do confronto das observações, em todos os domínios de comprimento de onda, com os modelos teóricos que os astrónomos esperam desvendar a verdadeira natureza dos AGN. A comunidade astronómica que estuda os AGN espera por isso com alguma impaciência os dados dos últimos satélites X (tais como o CHANDRA, lançado pela NASA em 1999, ou o XMM, lançado pela ESA em Dezembro passado - ver a rubrica Missões Espacias Astronómicas que temos vindo a publicar) que, pelo seu excelente desempenho, trarão seguramente informações preciosas para a investigação sobre estes objectos.

Fig.1 Modelo de unificação Seyfert 1/Seyfert 2. Este modelo pressupõe que as galáxias de Seyfert 1 e 2 são na verdade o mesmo tipo de objecto visto de diferentes ângulos de inclinação (o ângulo de inclinação é o ângulo formado pelo eixo do toro de poeiras e a linha de visão do observador). Assim, o telescópio 1 (pequeno ângulo de inclinação) observa uma galáxia com características de Seyfert 1 (BLR visível). O telescópio 2 observa uma galáxia com características de uma Seyfert 2 (BLR invisível). O zoom mostra a região central de uma galáxia de Seyfert segundo o modelo standard: um disco de acreção colapsando em direcção a um buraco negro de vários milhões de massas solares que, ao aquecer, irradia no comprimento de onda dos ultravioleta.
(1) Um buraco negro é um corpo cuja densidade é de tal modo elevada que a velocidade de escape à sua superfície (ou seja, a velocidade que seria preciso dar a um projéctil para que ele pudesse escapar à atracção gravitacional do buraco negro) é superior à velocidade da luz; daqui resulta que nada, nem mesmo a luz, pode escapar à atracção gravitacional de um tal corpo. Observar directamente um buraco negro é por isso impossível e é apenas pelo efeito que este exerce sobre o seu ambiente circundante que nos é permitido detectá-lo.

Doutor Pierre Olivier Petrucci
Observatório Astronómico de Brera (Milão)



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