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A Descoberta da Via-Láctea

A medição da estrutura da Galáxia é também a história da medição da distância às estrelas. Após a proposta de sistema heliocêntrico de Nicolau Copérnico em meados do século XVI, o dinamarquês Tycho Brahe procurou medir a distância às estrelas nos finais desse mesmo século, mas a falta de sucesso manteve a crença da existência de uma esfera de estrelas fixas, para além do Sistema Solar, sem se saber a que distância. Cerca de 1720, James Bradley mostra que o movimento aparente anual da estrela gama Draconis reflecte o movimento de translação da Terra em torno do Sol, pelo método de paralaxe entre duas estrelas (duplas, estrelas na mesma linha de visão mas uma muito mais próxima que a outra). William Herschel nos finais do século XVIII, com o seu Grande Telescópio de 40 pés de distância focal, faz uma busca sistemática de estrelas duplas e convence-se que uma boa parte delas serão verdadeiros sistemas binários. Também confirma o que Galileu Galilei tinha descoberto: essa zona esbranquiçada no céu está polvilhada de estrelas e pequenas estruturas nebulosas.

Em 1839, Friedrich Bessel tinha acumulado centenas de dados sobre a estrela 61 Cisne e deduz a sua paralaxe como sendo de 660000 unidades astronómicas (UA), ou seja, muito para além do Sistema Solar (40 UA). Dois meses depois, Thomas Henderson, que regressava de uma campanha de observação na África do Sul, publica a paralaxe para alfa Centauro, colocando-a a menos de 200000 UA. F. G. Wilhelm Struve, Director do Observatório russo de Dorpat (Estónia) começa os estudos de estrelas duplas e paralaxes em 1824. Porém, é nomeado Director e responsável pela contrução do grande observatório de Pulkova (São Petersburgo) e isso atrasa-lhe os trabalhos de investigação. Struve publica a paralaxe para Vega (alfa Lira) em 1839, como sendo de 0,261" ou seja a 800000 UA.

Após 1855, Struve é o astrónomo de renome internacional que ajuda Filipe Folque e Frederico Oom (por mandato de D. Pedro V), a planear os diversos telescópios e o edifício do futuro Observatório Astronómico de Lisboa. Frederico Oom treina-se nos trabalhos de observação em Pulkova sob orientação de Struve, regressa a Lisboa onde se torna o primeiro Director do OAL, e desenvolve trabalhos nestas áreas de investigação, granjeando reconhecimento internacional para o OAL.

A Via Láctea começa a ser medida: o Cosmos expandiu-se no conhecimento humano. Em meados do século XVIII, Immanuel Kant tinha sugerido que a Via Láctea tinha um estrutura (distribuição de estrelas) em disco no qual o Sol está imerso. As descobertas das nebulosas por parte de Herschell mais evidenciavam a teoria dos Universos Ilha do filósofo Kant. A contagem de estrelas feita por Herschel leva- -o a confirmar que o Sol estará no centro de uma estrutura tipo elíptica, em que o raio maior seria 5 vezes a sua espessura.

É preciso esperar o advento da fotografia em finais do séc. XIX para se poderem ver estrelas, nebulosas e galáxias nunca vistas por olhos humanos. Agora as contagens podem ser mais exactas, e uma discussão inicia-se entre H. von Seeliger, J. C. Kapteyn e P. van Rhijn. Kapteyn conclui que a Via-Láctea é esferóide achatado, 5 vezes maior no raio do disco do que na espessura, e em que o Sol está a 650 parsecs (pc) do centro. Conclui também que a densidade de estrelas diminui com a distância ao centro Galáctico. Este modelo é o mais convincente dos três mas mantêm-se muitas dúvidas.

Em 1917 é construído no monte Wilson (EUA) o Grande Telescópio de 100 polegadas. Harllow Shapley estuda a distribuição dos enxames globulares de estrelas e descobre que estes estão organizados numa estrutura aproximadamente esférica, cujo centro parece estar na direcção do Sagitário e a 15 kpc do Sol. Perde-se nestes anos o heliocentrismo à escala Galáctica. Sabemos hoje que o centro Galáctico está a 8 kpc do Sol. Paralelamente, H. Curtis, que se notabilizava pelo estudo de galáxias espirais, defende que estas galáxias serão exteriores à nossa e semelhantes à Via Láctea. Contudo, as dimensões que Shapley deduz são muito superiores às obtidas pela contagem de estrelas, e ele dá mais razão ao modelo de Kapteyn. Shapley argumentava que essas outras galáxias estavam próximas da nossa e eram relativamente pequenas em tamanho.

Em 1923, Edwin Hubble demonstra que a galáxia de Andrómeda estava a cerca de 300 kpc de distância (pela observação de estrelas RR Lira), sendo por isso uma galáxia exterior à nossa, tão grande quanto a Via-Láctea. O estudo de estrelas cefeidas e das velocidades das estrelas leva B. Lindblad, em finais dos anos 20, a descobrir a dinâmica de rotação da Via-Láctea, calculando-lhe uma velocidade de 250 km/s. Em 1928, J. Oort desenvolve a estrutura de rotação diferencial da Galáxia, explicando também a existência de estrelas de alta velocidade: as do halo Galáctico. O modelo de Kapteyn passa para a história e agora, os estudos espectroscópicos de alta precisão levam ao digrama de Hertzsprung-Russel que é utilizado como ferramenta fundamental para entender as estrelas. Os dados estão lançados! Percebem-se bem as estrelas azuis e as vermelhas e a estrutura de braços na Via-Láctea emerge nos trabalhos subsequentes por W. Baade, em 1944, quando define que há duas populações de estrelas na Galáxia: I) as estrelas jovens do disco da Galáxia, com órbitas circulares e elevada composição química, e II) as velhas do halo Galáctico, pobres em composição química e de alta velocidade com órbitas excêntricas. Em 1962 aparece o primeiro modelo que explica a formação da Via-Láctea, apresentado por Ollin Eggen, Lynden Bell e Allan Sandage.

Mas muito fica ainda por contar...


Doutor Rui Agostinho
Coordenador do CAAUL



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