PÁGINA - ( 1 ) ( 2 ) ( 3 ) ( 4 ) ( 5 ) ( 6 ) ( 7 )
 

Outros Tempos, Outras Estrelas

  Um estudo conduzido por uma equipa internacional de astrónomos permitiu determinar a percentagem dos diferentes tipos de estrelas quando o Universo era jovem. Este resultado dá-nos uma indicação sobre a "cor" das galáxias no Universo quando este tinha menos de 20% da sua idade actual.
  Sendo a velocidade da luz no vazio uma constante (300.000 km/s), a luz emitida por galáxias longínquas demora muito tempo a chegar até nós. Olhar para longe significa assim olhar para o passado. No entanto, estudar galáxias longínquas não é fácil, já que devido à grande distância que nos separa, estas são de brilho extremamente débil. Para complicar a situação, este problema é agravado pelo facto da expansão do Universo induzir o chamado desvio de Doppler para o vermelho: quando um objecto se afasta de nós, todo o seu espectro de luz é deslocado para comprimentos-de-onda (ou cores) mais avermelhados. Assim, as galáxias distantes são quase indetectáveis em comprimentos-de-onda visíveis. Para as estudar os astrofísicos têm de recorrer a instrumentos capazes de observar, por exemplo, no infra-vermelho.

Galáxia NGC613 observada com o instrumentos FORS1 e FORS2, nos telescópios MELIPAL e YEPUN, do VLT, ESO. Cortesia do ESO.

  Uma equipa internacional de astrónomos recorreu agora à câmara de infra-vermelhos ISAAC (do telescópio ANTU, do VLT, ESO), para estudar uma região do céu denominada de Hubble Deep Field South (ver O Observatório, Vol.9, n.º1). Após cerca de 100 horas de observação, os astrónomos detectaram umas 300 galáxias, para as quais determinaram a distância.
  Como um dos resultados da expansão do Universo é que quanto mais longe se encontrar uma galáxia, mais depressa se afasta de nós, uma medida do desvio para o vermelho permite-nos estimar a distância a que esta se encontra, tal como qual a idade que o Universo tinha quando a luz da galáxia foi emitida na nossa direcção.
  As galáxias observadas encontram-se numa gama variada de distâncias, estando algumas delas separadas de nós por cerca de 11,5 mil milhões de anos-luz. As mais distantes emitiram a luz agora observada quando o Universo tinha apenas 2,2 mil milhões de anos (hoje aceita-se que a idade do Universo é de cerca de 14 mil milhões de anos).
  Estudando a luz destas galáxias, os astrónomos conseguiram verificar que as mais distantes são claramente mais azuis do que as que se encontram mais próximas de nós. Este resultado indica que o Universo mais jovem continha uma maior percentagem de estrelas de grande massa (quentes e azuis). Estas estrelas, porém, evoluem e morrem em cerca de 10 milhões de anos, mais depressa do que as estrelas amarelas e avermelhadas, tal como o nosso Sol, que podem durar mil vezes mais. Assim, e à medida que o Universo foi envelhecendo, as estrelas mais azuis morreram, deixando a preponderância às estrelas mais frias e vermelhas.
  Este estudo permitiu ainda verificar que quando o Universo tinha cerca de 3 mil milhões de anos, o número total de estrelas era 10 vezes inferior ao actual, e que cerca de metade das estrelas actualmente observadas no Universo se formaram após este ter ultrapassado cerca de metade da idade actual.

Nuno Santos
CAAUL/OAL

 

O Enxame de Galáxias mais distante

  A combinação dos telescópios mais poderosos hoje existentes, em terra e no espaço, vai lentamente revelando as características do Universo primitivo. Desta vez, os astrónomos combinaram observações no rádio e óptico, para identificar o proto-enxame de galáxias mais distante conhecido até hoje, a cerca de 12 mil milhões de anos-luz (quando o Universo tinha apenas 10% da sua idade actual).

A imagem revela um aglomerado de galáxias em formação, cerca de 1,5 mil milhões de anos após o Big Bang. Este proto-enxame é dominado pela rádio galáxia TNJ1338-1942, uma galáxia jovem de grande massa (indicada pelo círculo branco na imagem). Outras galáxias mais pequenas foram descobertas à mesma distância (círculos azuis na imagem). Os restantes objectos são essencialmente galáxias que se interpõem na nossa linha de visão. Cortesia da NASA, ESA, G. Miley e R. Overzier (Observatório de Leiden).

  O nascimento de galáxias e das estruturas onde elas se encontram, os enxames, é um dos grandes mistérios da Astronomia actual. As observações parecem revelar estruturas cada vez mais distantes e o seu estudo vai sugerindo que a passagem de um Universo "homogéneo" (ou quase), pouco após o Big Bang, para um Universo cheio de estruturas bem definidas aconteceu muito rapidamente e muito cedo.
  Desta vez, os investigadores estudaram uma região do céu em torno de uma fonte de rádio situada a 12 mil milhões de anos-luz, a TNJ1338-1942. Pensa-se que a fonte de rádio é uma galáxia de grande massa em evolução rápida que deve o seu brilho (no rádio) a um buraco negro supergigante, e que poderia pertencer a um aglomerado de galáxias em formação. O estudo seguinte, usando o VLT, do Observatório Europeu do Sul, revelou de facto alguns pontos de luz ( cerca de 20) nas proximidades... Quando observados espectroscopicamente, estes mostram uma risca de emissão que poderia corresponder à risca de Lyman-a do hidrogénio quando observada à distância da rádio-galáxia. Eis pois uma amostra de fontes candidatas a uma estrutura que, após muitos milhões de anos, se viria a tornar um enxame de galáxias como os que vemos no Universo actual. Mas urgia testar a conjectura...
  Observações com o telescópio espacial Hubble de 12 das fontes que rodeiam a TNJ1338-1942 vieram confirmar a descoberta. As cores ópticas correspondem de facto às esperadas de galáxias àquela distância, e a resolução superior do Hubble permitiu ainda verificar que metade destas fontes são extensas, apresentando três delas uma morfologia que sugere uma colisão com galáxias vizinhas. Outras fontes com cores semelhantes foram ainda reveladas, novos possíveis membros deste enxame em formação.
  Toda a estrutura agora estudada ocupa uma extensão de alguns megaparsec que, relembre-se, é observada apenas 1,5 mil milhões de anos após o Big Bang. Tal impõe um constrangimento muito grande às teorias de formação de estruturas, que devem agora justificar a grande actividade necessariamente existente nos primeiros 5-10% da idade do Universo...

José Afonso
CAAUL/OAL

© 2004 - Observatório Astronómico de Lisboa