Um cometa em desintegração
Observações realizadas com o auxílio de um dos telescópios de 8.2 m do VLT (ESO, Chile) permitiram
observar o fenómeno da desintegração de um cometa. O cometa em causa, denominado de Schwassmann-Wachmann 3, parece ter o futuro comprometido.
Imagem do cometa SW3 obtida com o VLT. A imagem mostra a presença de vários fragmentos. Os pontos coloridos correspondem à imagem de uma estrela de fundo, que se movia relativamente ao cometa à medida que este era observado em diferentes filtros.
Cortesia do ESO.
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Embora muitos detalhes sejam ainda desconhecidos, hoje sabe-se que os cometas são constituídos por rochas e gelos, numa amálgama que faz lembrar uma espécie de grande bola de neve "suja". A presença de grandes quantidades de gelos é
responsável pela grande fama destes corpos. Quando se aproximam das regiões interiores do Sistema Solar, a intensa radiação da nossa estrela leva à sublimação dos gelos (passagem do estado sólido para o estado gasoso). O cometa ganha assim uma "cabeleira", e torna-se suficientemente brilhante para ser observado a partir da Terra. Entretanto, os gases e poeiras lançados para o Espaço são arrastados pelo vento solar e pela pressão de radiação, e dão então origem a magníficas caudas que se estendem por milhares de milhões de quilómetros.
No entanto, a estrutura dos cometas, associada à sua pequena
massa acaba por conduzir muitas vezes à sua destruição. Tal foi já
observado em cerca de 30 cometas, que a dada altura acabaram por
se partir em vários bocados, expondo o material gelado do seu
interior à intensa radiação solar, e aumentando o seu brilho de forma
considerável. Um dos exemplos mais recentes deu-se com o famoso
Shoemaker-Levy 9, que em 1992 se partiu em pelo menos 21
fragmentos antes de mergulhar na atmosfera de Júpiter. Nesse caso,
o responsável pela sua fragmentação foi a gravidade do planeta.
Agora, utilizando os grandes telescópios do VLT, os astrofísicos
puderam observar em detalhe a fragmentação de um
outro cometa, o Schwassmann-Wachmann 3 (SW3).
Este cometa foi descoberto em 1930 em placas
fotográficas obtidas no observatório de Hamburgo
(Alemanha). Observações complementares mostraram
que orbitava o Sol numa órbita muito alongada
com um período de pouco mais de cinco anos. O
SW3 só foi avistado de novo cerca de 50 anos depois,
em 1974. Desde então tem sido observado em quase
todas as vezes que se aproximou do Sol.
Em 1996, observações recolhidas com vários
telescópios incluindo os do ESO, mostraram que o
SW3 se tinha partido em vários bocados. Em 2001,
durante a sua última passagem pelo Sistema Solar interior,
apenas três destes pedaços eram suficientemente
brilhantes para serem vistos, e nenhuma actividade
particular foi observada. No entanto, este ano, as
observações mostraram que o cometa se fragmentou
ainda em mais pedaços. Um deles tornou-se
subitamente mais brilhante no início de Abril. As
imagens obtidas com o VLT mostraram a razão: o cometa voltou a
fragmentar-se. O SW3 deu assim origem a um verdadeiro enxame de
mini-cometas.
A razão deste fenómeno não é clara. Se no caso do Shoemaker-Levy 9 foi a gravidade de Júpiter a responsável
pela fragmentação,
neste caso, o SW3 encontra-se bastante longe do planeta gigante.
Uma possibilidade é que da última vez que o SW3 passou
relativamente perto de Júpiter, a gravidade do planeta abriu uma
série de fendas no pequeno cometa, expondo partes do seu interior.
Ao aproximar-se do Sol, o gelo agora exposto sublimou, aumentando
o tamanho das fendas, e acabando por quebrar o cometa.
Nuno Santos
CAAUL/OAL
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Analisando os fósseis... de um grupo de galáxias
Recorrendo à sensibilidade e resolução dos
observatórios espaciais de raios-X XMM-Newton
(da ESA) e Chandra (NASA), uma equipa de
astrónomos procurou entender o processo de
formação dos chamados grupos fósseis de galáxias,
entidades que foram, no passado, grupos de galáxias
mas dos quais apenas sobram actualmente vestígios.
Vestígios que apontam para um canibalismo
cósmico sem limites...
A observação nos raios-X (XMM-Newton) do grupo fóssil RX J1416.5+2315 revela uma nuvem de gás quente (a azul),
com temperaturas superiores a 50 milhões de graus, que se estende por mais de 3 milhões de anos-luz. A galáxia central é uma galáxia elíptica gigante que se crê ter crescido por canibalismo.
Cortesia: H. Khosroshahi, T. Ponman, L. Jones (Univ. de Birmingham) e B. Maughan (CfA), ESA, ING.
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Um grande número de galáxias reside em grupos,
onde são sujeitas a interacções gravitacionais com
as suas vizinhas e com a matéria escura que abunda
no espaço intergaláctico. Estas interacções causam
um "decaimento" progressivo das galáxias para
as regiões mais centrais do aglomerado, onde podem
acabar por ser "engolidas" por uma galáxia central
gigante. Eventualmente, este processo pode levar
ao "decaimento" de todas as galáxias nesta galáxia
central. Se não existir nenhuma entrada de novas
galáxias no grupo, então estamos perante um
chamado grupo fóssil de galáxias, onde
praticamente todas as estrelas se encontram numa única galáxia
gigante, no centro de um halo gigantesco de matéria escura. É nos
raios-X que este halo pode ser revelado, devido ao gás
intergaláctico que atinge temperaturas de milhões de graus.
O grupo fóssil RX J1416.4+2315 é o mais massivo jamais
encontrado, e foi o escolhido para revelar os mistérios da
formação deste tipo de estruturas. A cerca de 1500 milhões de
anos-luz de distância, é dominado por uma galáxia elíptica
gigantesca. As novas observações com os
observatórios XMM-Newton e Chandra,
combinadas com observações no óptico e
infravermelho, revelaram o halo deste grupo fóssil,
rico em gás quente (a uma temperatura de 50
milhões de graus, devida ao aquecimento gerado
pelos choques envolvidos no colapso gravitacional
da estrutura), que se estende por mais de 3
milhões de anos-luz. A massa total deste grupo
atinge os 300 biliões de massas solares, dos quais
2% correspondem a estrelas, 15% a gás quente e
o restante a matéria escura não luminosa.
Segundo os modelos existentes, um grupo fóssil
como o RX J1416.4+2315 não deveria ter tido
tempo para se formar. O processo pelo qual uma
galáxia num grupo perde energia, progressivamente
deslocando-se para o centro deste
(fricção dinâmica) necessita de ser mais eficiente
do que anteriormente considerado para explicar a
formação do RX J1416.4+2315 em muito menos
de 13.7 mil milhões de anos (a idade do Universo).
A massa inicial deste aglomerado, a sua distribuição e geometria
e velocidade da queda das suas galáxias originais, têm agora de
ser consideradas, no sentido de compreender a formação deste
(e outros) grupos fósseis. Tal poderá também revelar a origem
das galáxias mais brilhantes nos aglomerados actuais, já que se
pensa que os grupos fósseis podem constituir as sementes que
levam à formação de novos aglomerados, em torno das galáxias
gigantes remanescentes.
José Afonso
CAAUL/OAL
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