Página - 1* A Galáxia do Charuto, um berçário de estrelas 2* Estudar Física: uma das melhores maneiras de assegurar o futuro!
* Agenda
3* Um cometa em desintegração
* Analisando os fósseis... de grupos de galáxias
4* "Ainda não se descobriu um planeta como a Terra" 5 6* Para Observar em Junho
  VISIBILIDADE DOS PLANETAS
  Alguns Fenómenos Astronómicos
  Fases da Lua
* Astro Sudoku
7* O Céu de Junho
* Nascimento, Passagem Meridiana e Ocaso dos Planetas
(Versão do Boletim em PDF)

Astronomia Forense
A Justiça dos Astros

A ciência é uma ferramenta poderosa na compreensão do mundo que nos rodeia. Na sua necessidade de explicar e entender o seu meio ambiente, os seres humanos foram evoluindo a nível intelectual e a nível social. Criaram regras pelas quais as sociedades actuais se regem, de forma a obterem uma existência mais pacífica e civilizada - as leis. É um facto que nem sempre estas regras são respeitadas e obedecidas, sendo portanto necessário apurar a verdade acerca das pessoas que alegadamente as desrespeitam e dos actos que cometem. A ciência forense é uma área da ciência com uma enorme importância para as instituições que legalmente julgam os casos de desrespeito da lei, os tribunais.


O desenvolvimento exponencial que se verificou na ciência dos últimos 100 anos forneceu ferramentas e técnicas de grande precisão com uma grande importância para a investigação criminal. A área forense abrange praticamente todas as áreas da ciência, tais como a biologia, medicina, física, química, geofísica, etc. Hoje em dia, com a enchente de séries televisivas que abordam a ciência forense, esta área começa a ser cada vez mais conhecida, assim como os vários ramos da ciência que contribuem para ela. No entanto, existe uma ciência importante que é pouco associada à área forense e que no entanto fornece muitas vezes a última palavra no julgamento de um alegado crime - a Astronomia.

Muitos dos dados que podemos obter através da observação dos astros, especialmente acerca da posição do Sol e da Lua, são bem conhecidos e podem ser previstos e calculados com precisão para qualquer intervalo de tempo - no passado, no presente e no futuro.

A Astronomia forense fornece explicações claras e precisas a tribunais, advogados, detectives e investigadores, acerca da importância das condições de luminosidade/visibilidade, assim como de cálculos precisos da posição da Lua e Sol numa data/hora e local específicos. Desta forma ajuda na reconstrução de um crime ou acidente e permite apurar a veracidade dos depoimentos prestados pelas alegadas vítimas ou acusados.

A luz natural, ou seja, a luz proveniente do Sol, quer seja directa no caso do período diurno, ou indirecta no caso da luz reflectida pela Lua no período nocturno, é um factor de grande relevância em muitos casos jurídicos. Muitas vezes num caso de acidente de viação é argumentado que o condutor foi encadeado pela luz do Sol, seja directa ou indirectamente, no caso de a luz ser reflectida num objecto, e que a origem do acidente foi esse encadeamento. Um astrónomo pode calcular facilmente a posição do Sol na altura do acidente em questão de forma a saber se o encadeamento seria ou não possível.

Muitas pessoas quando testemunham em tribunal usam a sua percepção de tempo para expressar um momento em que um evento ocorreu. Exemplos comuns de expressões muito utilizadas são: "antes do anoitecer", "logo após o pôr-do-Sol", "ainda havia luz lá fora". Na maioria dos casos estas expressões são demasiado vagas para poderem ser usadas como provas irrefutáveis de um acontecimento. No entanto, calculando a hora exacta do pôr-do-Sol num determinado dia em questão, pode transformar uma afirmação vaga como "logo após o pôr-do-Sol", numa afirmação mais concreta e credível como "aproximadamente às 18:30 da tarde".

Existem casos de pessoas que alegam ter visto o suspeito de um crime ou mesmo o próprio acto a ser cometido. No caso de a ocorrência se ter passado no período nocturno torna-se algo difícil avaliar a veracidade do testemunho sem a perícia adequada. A Astronomia forense pode fornecer a indicação do brilho da Lua nessa noite e assim calcular a luminosidade de uma certa área de forma a concluir se seria ou não possível a testemunha ter visto o que viu.

Existem vários factores que são tomados em conta quando um astrónomo forense estuda um caso deste tipo, relacionado com condições de luminosidade. Como facilmente podemos induzir, se houver nuvens no céu, a luz solar (ou o luar) será substancialmente diminuída. Assim, é imperativo que as condições atmosféricas sejam tomadas em conta de forma a que o parecer seja o mais correcto possível. A luz artificial e a topografia também têm de ser tomadas em conta.

Em testemunhos de defesa de um alegado suspeito pode acontecer que este apresente uma fotografia sua, tirada por exemplo durante o dia, e use essa prova como álibi que garante que não esteve no local do crime a uma certa hora pois aparece na fotografia num local diferente e à mesma hora. Um astrónomo forense pode estudar a fotografia de forma a analisar e medir sombras presentes na foto e, no caso de serem visíveis, observar a posição dos corpos celestes. Com qualquer um destes elementos o cientista pode facilmente inferir a data e hora a que a fotografia foi tirada, corroborando a versão do arguido ou pondo em causa a credibilidade deste.

O Observatório Astronómico de Lisboa (OAL), fornece pareceres e informação técnica de Astronomia para os tribunais portugueses e advogados. Na maioria das vezes estes pareceres estão relacionados com acidentes de viação, principalmente com situações de alegado encadeamento, e condições de visibilidade/luminosidade.

Não são apenas os tribunais que recorrem ao auxílio da Astronomia. É comum as companhias de seguro fazerem uso destes conhecimentos para poderem apurar responsabilidades.

Não há dúvida que a Astronomia é uma ciência abrangente!


Agradece-se a contribuição valiosa para este texto da astrónoma do OAL, Dr.ª Alfredina do Campo, responsável pelos pareceres realizados pelo OAL.

João Retrê
OAL
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