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Uma estrela sem metais

O estudo da origem e evolução dos elementos no Universo constitui um dos assuntos mais bem estudados da astrofísica moderna. Segundo as teorias actuais, durante o Big-Bang foram produzidos os elementos mais "leves": hidrogénio, hélio, e uma pequeníssima proporção de lítio. Foi basicamente a partir deste gás "original" que se formaram as galáxias, das quais a nossa Via-Láctea é um exemplo.

Imagem do ESO Digitized Sky Survey com a estrela HE0107-5240 (cortesia ESO.)

As quantidades hoje observadas de elementos mais "pesados" (tais como o ferro, silício, etc...) resultaram posteriormente do desenrolar de reacções nucleares no interior das estrelas, que mais tarde expeliram o seu conteúdo (como supernovas, por exemplo) espalhando os elementos nelas produzidos pelo meio interestelar. O resultado das sucessivas gerações de estrelas salda-se desta forma por um enriquecimento progressivo da nossa galáxia em elementos pesados. Como as estrelas se formam a partir do material disponível no meio interestelar, quanto mais antigas são, menos metais têm (na gíria astronómica os metais são todos os elementos que não hidrogénio e hélio).

Ora, uma das questões que se coloca hoje é a de saber se ainda restam algumas das primeiras estrelas, objectos que serão extremamente pobres em metais. Em princípio seria possível encontrar as menos maciças de entre estas, já que quanto menor for a massa de uma estrela maior será o seu tempo de vida. No entanto, até há pouco tempo as buscas tinham sido em vão.

Utilizando o telescópio de 1-m do ESO, em La Silla (Chile), uma equipa internacional de astrónomos inspeccionou milhões de estrelas visíveis do hemisfério sul terrestre procurando objectos que pudessem ser constituídos apenas por hidrogénio. Para cada uma obtiveram um pequeno espectro, o que lhes permitiu ter uma ideia aproximada de qual a sua composição química. Os melhores candidatos a "estrela primordial" foram posteriormente observados com outros instrumentos mais poderosos, tais como o telescópio de 8-m VLT Kueyen (do ESO), acoplado ao espectrógrafo de alta resolução UVES.

Espectro do Sol (em cima) e de 2 estrelas pobres em metais, bem como de uma hipotética estrela sem metais. Como se pode ver, a presença de elementos pesados é demarcada pela existência de linhas espectrais, que se tornam cada vez mais pequenas à medida que diminui, por exemplo, a razão de ferro para hidrogénio (cortesia ESO).

Uma das estrelas observadas foi a HE0107-5240, uma estrela gigante que se encontra a cerca de 36000 anos-luz. Os espectros deste objecto permitiram determinar de forma precisa a sua composição química. Os resultados revelaram-se fantásticos: a HE0107-5240 é a estrela mais pobre em metais que alguma vez foi observada! Uma análise detalhada permitiu averiguar que possui uma proporção de elementos pesados para hidrogénio que é 200000 vezes menor que a encontrada no Sol.

Esta descoberta tem implicações enormes, já que nos dá a possibilidade de, por exemplo, testar os modelos de formação e evolução estelar, bem como de estudar a composição química do Universo antigo.

Um dos resultados mais importantes desta descoberta está relacionado com o facto de que segundo os modelos actuais é muito difícil formar uma estrela a partir de uma nuvem de gás constituída apenas de hidrogénio e hélio (os metais são necessários para permitir que a nuvem se condense e dê origem à estrela). A descoberta da HE0107-5240 permite exactamente verificar que é possível formar estrelas num ambiente tão pobre em metais. Por outras palavras, as teorias de formação de estelar têm de ser ligeiramente reequacionadas.

No entanto, é importante dizer que a HE0107-5240 possui ainda assim alguns metais. A origem destes pode estar relacionada com o facto desta estrela não se ter na realidade formado a partir de material primordial, mas sim de gás que tinha já sido "poluído" por outras estrelas que se formaram (e morreram) anteriormente. Desta forma, a busca da "estrela primordial" continua: alguns outros candidatos estão já à espera para ser observados.

O Sol visto "à lupa"

Mesmo utilizando os melhores telescópios do mundo, a grande maioria das estrelas que podemos observar no céu nocturno são simplesmente "pontos" de luz. Na realidade, a grande distância que nos separa delas não nos permite distinguir detalhes nas suas "superfícies". Desta forma, o único exemplo claro de uma estrela sobre a qual temos informação mais detalhada é o Sol.

Mas mesmo estando tão perto da Terra (a distância que separa a Terra do Sol é cerca de 200000 vezes menor do que aquela que nos separa da estrela mais próxima), os astrónomos debatem-se ainda com inúmeros mistérios. Alguns destes podem mesmo estar intimamente ligados à nossa existência: sabe-se hoje que a actividade e variabilidade solares influenciam em muito o clima na Terra. Numa altura em que se debate calorosamente o aquecimento global, urge compreender qual é exactamente a influência que a nossa estrela tem no nosso dia-a-dia.

Imagem de um detalhe da fotosfera solar na região de uma mancha. Os filamentos em torno da mancha têm uma largura de cerca de 150 a 180km (cortesia da Royal Swedish Academy of Sciences)
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Para tentar desvendar os mistérios solares, os astrónomos vêm desenvolvendo nos últimos anos um grande esforço para construir instrumentos capazes de "ver" o Sol com cada vez maior detalhe. Agora, utilizando o Swedish Solar telescope (um novo telescópio solar de 1-m nas ilhas Canárias, Espanha) uma equipa de astrónomos suecos conseguiu obter imagens do Sol com uma resolução nunca antes conseguida.

Graças ao uso de óptica adaptativa, que corrige as deformações provocadas pela atmosfera terrestre, as imagens permitem ver detalhes na "superfície" solar (normalmente denominada de fotosfera) com uma resolução de 75km! A imagem apresentada nesta página mostra em grande detalhe a região de uma mancha solar. Tal como acontece frequentemente quando se consegue observar um objecto celeste em maior detalhe, esta imagem originou já uma série de questões inesperadas.

Em particular, podem-se ver com grande detalhe na imagem uma série de filamentos em torno da mancha solar; esta região em torno de uma mancha denomina-se por "penumbra", e é formada por inúmeros filamentos. Embora se pense que os filamentos são formados por tubos magnéticos que transportam material extremamente quente e ionizado (plasma), a sua natureza exacta não é conhecida e o seu mecanismo de formação é ainda um mistério.

Mas mais interessante ainda, a imagem permitiu descobrir que cada filamento contém um núcleo mais escuro. A descoberta da presença destes núcleos escuros nos filamentos vem adensar ainda mais o problema: os astrónomos debatem-se agora para tentar perceber a sua origem.

Uma explicação satisfactória terá provavelmente que esperar novas simulações numéricas ou observações ainda mais detalhadas, como as que serão possíveis com o satélite solar japonês Solar-B, cujo lançamento está previsto para 2005.

Doutor Nuno C. Santos



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