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Uma Estrela Desfeita

  Utilizando dois telescópios de raios-X, uma equipa internacional de astrónomos detectou aquilo que parece ter sido o último "grito" de uma estrela, quando esta foi desfeita ao passar perto de um buraco negro.

Ilustração sobre o processo que deve ter ocorrido na galáxia RX J1242-11, quando o buraco negro central destruiu uma estrela que passava por perto. 1) A estrela aproxima-se do buraco negro. 2) À medida que a distância encurta, a estrela é "esticada" devido à força de maré. 3) A estrela é finalmente destruída ao passar demasiado perto do buraco negro. Cortesia da NASA/CXC/M. Weiss.

  O centro de uma grande parte das galáxias conhecidas, incluindo a nossa própria Via-Láctea, parece ser habitado por verdadeiros monstros, buracos negros com milhões de vezes mais massa que Sol. Estes buracos negros têm um apetite voraz, atraindo e engolindo o gás que se encontra à sua volta. No entanto, até hoje nunca se tinham encontrado provas de que estes monstros pudessem ser responsáveis pela morte de estrelas.
  Agora, uma equipa de astrofísicos liderada por Stefanie Komossa, do Max Planck Institute for Extraterrestrial Physics (Alemanha), encontrou evidências claras de que um destes buracos negros, no centro da galáxia RX J1242-11, desfez uma estrela semelhante ao Sol, engolindo parte do seu material.
  As observações, realizadas utilizando os telescópios de raios-X XMM-Newton (ESA) e Chandra (NASA), detectaram a presença de uma "explosão" de raios-X com uma intensidade nunca antes observada. As imagens de alta resolução, conseguidas com o Chandra, permitiram verificar que a "explosão" (que não se encon-trava presente em imagens mais antigas obtidas pelo satélite alemão Roentgen) se deu de facto no centro da galáxia RX J1242-11. A posterior análise dos espectros de raios-X obtidos com o XMM- -Newton mostrou sinais claros de que o acontecimento se deu na vizinhança de um buraco negro. Os dois resultados combinados permitiram concluir que a única explicação para a "explosão" observada é que alguma estrela semelhante ao Sol terá passado demasiado perto do buraco negro, sendo distorcida e desfeita.
  O processo que levou à destruição da estrela é em tudo semelhante ao processo que provoca as marés na Terra. A gravidade da Lua atrai de forma diferencial o nosso planeta, fazendo-o esticar ligeiramente (alguns metros nos oceanos, e alguns centímetros nos continentes). Neste caso, o buraco negro é tão massivo que conse-guiu distorcer a estrela até que esta se desfez. Uma pequena parte do material desse "sol" acabou por ser engolido pelo buraco negro.
  Esta observação pode-nos fornecer pistas muito importantes sobre os processos de formação e crescimento dos buracos negros gigantescos existentes no centro de muitas galáxias.


Nuno Santos
CAAUL/OAL

 

A (nova) Galáxia mais Distante

  Nos últimos meses, os meios astronómicos têm assistido a uma autêntica batalha para quebrar o recorde da galáxia mais distante conhecida. Em Fevereiro apareceu um novo recorde, uma galáxia observada quando o Universo tinha apenas 5% da sua idade actual, que viria a ser "pulverizado" apenas duas semanas mais tarde, com uma galáxia ainda mais distante.

A imagem do enxame de galáxias que, por efeito de lente gravitacional, ajudou a descobrir a galáxia mais distante conhecida (círculo branco), numa imagem no infravermelho próximo obtida com o VLT (instrumento ISAAC). O painel inferior mostra a galáxia primitiva no óptico (banda R, não detectada) e em três bandas do infravermelho próximo (bandas J, H e K). Cortesia ESO e R. Pelló (Lab. Astrofísica, Toulouse).

  Uma das maiores dificuldades na observação de galáxias distantes consiste no facto da expansão do Universo "deslocar", por efeito de Doppler, a luz emitida por um objecto longínquo para comprimentos de onda mais longos, ou seja, mais vermelhos. Na prática, as galáxias mais distantes não são detectáveis no visível - a sua emissão óptica foi "deslocada" pela expansão do Universo para comprimentos de onda no infravermelho. Mas a observação no infravermelho é bastante mais complexa do que no óptico (mesmo o escuro céu nocturno brilha no infravermelho). Considerando ainda que a enorme distância diminui o brilho aparente das galáxias mais longínquas, parecia que, apesar de todo o avanço tecnológico, a observação e estudo das primeiras galáxias e estrelas formadas após o Big-Bang teria de esperar pela nova geração de telescópios.
  Porém, os astrónomos não conseguem esperar e descobriram (já há alguns anos) que podem usar uma "lente cósmica" para aumentar o poder dos telescópios que hoje possuímos. Um enxame de galáxias relativamente próximo pode, por efeito gravitacional, dobrar e amplificar a luz de uma galáxia distante, tal como uma lente de um telescópio (o efeito é justamente designado por "lente gravitacional"). Conhecendo a distribui-ção de massa do enxame (a lente), os astrónomos podem estimar qual a sua acção (a ampliação, por exemplo) na luz de uma galáxia distante na mesma linha de visão. Com ampliações suplementares de várias dezenas de vezes, o VLT, com 8.2 metros, transforma-se no equivalente a um poderoso telescópio de 40-80 metros!
  Assim, uma das galáxias descobertas encontra-se quando o Universo tinha cerca de 750 milhões de anos (dos 13.4 mil milhões de anos que hoje possui), tendo sido estudada com o telescópio espacial Hubble e com os telescópios Keck. Mais recentemente, usando obser-vações do VLT, uma outra galáxia foi detectada, quando o Universo tinha pouco menos de 500 milhões de anos. Ambas parecem ser pequenas, mas com uma formação estelar já bastante intensa (várias vezes a observada na Via-Láctea, que possui uma taxa média de uma massa solar de novas estrelas por ano). Contudo, qualquer estudo mais detalhado destas galáxias terá de esperar por telescópios mais potentes. Mesmo a determinação das respectivas distâncias foi efectuada no limite de operação dos telescópios usados. Ainda assim, as fronteiras continuam a ser ultrapassadas...


José Afonso
CAAUL/OAL

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