ESO 22/07 – Comunicação Científica

Astrónomos descobrem o Primeiro Planeta Habitável Semelhante à Terra
A Anã Também Possuía Outros Mundos!

Visão artistica do sistema multiplo Gliese 581

Visão artística do sistema planetário multiplo Gliese 581. Crédito: ESO.

Astrónomos descobriram o planeta mais semelhante à Terra até à data, fora do Sistema Solar, um exoplaneta com um raio apenas 50% maior do que o da Terra e possivelmente com água no estado líquido à sua superfície. Utilizando o telescópio de 3,6-m do ESO, uma equipa de cientistas Suíços, Franceses e Portugueses descobriram uma super-Terra com aproximadamente 5 vezes a massa da Terra em órbita de uma anã vermelha, já conhecida por albergar um planeta com aproximadamente a massa de Neptuno. Os astrónomos possuem também evidências fortes para a presença de um terceiro planeta com cerca de 8 vezes a massa da Terra.

Este exoplaneta – forma como os astrónomos designam os planetas em torno de outras estrelas – é o mais pequeno encontrado até agora [1] e completa uma órbita em 13 dias. Assim, encontra-se 14 vezes mais próximo da sua estrela do que a Terra do Sol. No entanto, dado que a sua estrela anfitriã, a anã vermelha Gliese 581 [2], é mais pequena e fria que o Sol – e, consequentemente, menos luminosa – o planeta encontra-se na zona habitável, a região em torno de uma estrela onde a água pode existir no estado líquido!

“Estimámos que a temperatura média desta super-Terra esteja entre 0 e 40 graus Celsius, e portanto a água estaria no estado líquido,” explica Stéphane Udry, do Observatório de Genebra (Suiça) e autor principal do artigo que apresenta a descoberta. “Para mais, o seu raio deverá ser de apenas 1,5 vezes o raio da Terra, e modelos prevêem que o planeta deverá ser ou rochoso – como a Terra – ou coberto de oceanos,” acrescentou.

“A água no estado líquido é um factor crucial para a vida tal como a conhecemos,” declara Xavier Delfosse, um membro da equipa da Universidade de Grenoble (França). “Devido à sua temperatura e relativa proximidade, este planeta será muito provavelmente um alvo muito importante para as futuras missões espaciais dedicadas à procura de vida extra-terrestre. No mapa do tesouro do Universo, seriamos tentados a marcar este planeta com um X.”

A estrela anfitriã, a Gliese 581, encontra-se entre as 100 estrelas mais próximas da Terra, localizada a apenas 20,5 anos-luz na constelação da Balança. Esta estrela possui uma massa de apenas um terço da massa do Sol. Tais anãs vermelhas são pelo menos 50 vezes intrinsecamente menos luminosas que o Sol e são as estrelas mais comuns na nossa Galáxia: entre as 100 estrelas mais próximas do Sol, 80 pertencem a esta classe.

“As anãs vermelhas são os alvos ideais na procura destes planetas pois emitem menos luz e a zona habitável encontra-se portanto muito mais próxima delas do que o que se verifica com o Sol,” enfatizou Xavier Bonfils, um investigador da Universidade de Lisboa. Os planetas localizados nesta zona são mais facilmente detectáveis através do método das velocidades radiais [3], o método mais eficaz na detecção de exoplanetas.

Há dois anos, a mesma equipa de astrónomos tinha já descoberto um planeta em torno da Gliese 581. Com 15 vezes a massa da Terra, ou seja, aproximadamente a massa de Neptuno, o planeta completa uma órbita em 5,4 dias. Na altura, os astrónomos tinham já observado pistas que indicavam a existência de outro planeta. Obtiveram então um novo conjunto de medições e descobriram a nova Super-Terra, mas também indicações claras da existência de outra, um planeta com 8 vezes a massa da Terra que completa uma órbita em 84 dias. O sistema planetário em torno da Gliese 581 contém então não menos de 3 planetas com massas iguais ou inferiores a 15 vezes a massa da Terra e, como tal, é um sistema impressionante.

A descoberta foi realizada graças ao HARPS (High Accuracy Radial Velocity for Planetary Searcher), provavelmente o espectrógrafo de maior precisão em todo o mundo. Instalado no telescópio de 3,6-m do ESO em La Silla, Chile, o HARPS é capaz de medir velocidades com uma precisão superior a um metro por segundo (ou 3,6 km/h)! O HARPS é um dos instrumentos de maior sucesso na detecção de exoplanetas e detém já vários recordes recentes, incluindo a descoberta de um “Trio de Neptunos” em torno de uma outra estrela.

As variações de velocidade detectadas estão entre 2 e 3 metros por segundo, o que corresponde a aproximadamente 9 km/h! Esta é a velocidade de uma pessoa a caminhar apressadamente. Tais sinais minúsculos não poderiam ter sido distinguidos do “ruído” pela maioria dos espectrógrafos disponíveis nos dias de hoje.

“O HARPS é uma máquina de caçar planetas única,” afirmou Michel Mayor, do Observatório de Genebra, e Investigador Principal do HARPS. “Dada a incrível precisão do HARPS, centrámos o nosso esforço nos planetas de pequena massa. E podemos dizer sem qualquer dúvida que o HARPS tem tido bastante sucesso: dos 13 planetas conhecidos com massa inferior a 20 vezes a massa da Terra, 11 foram descobertos pelo HARPS!”

O HARPS é também muito eficiente na descoberta de sistemas planetários, onde se requer a detecção de pequenos sinais. Os dois sistemas onde se sabe existirem três planetas de pequena massa – HD 69830 e Gl 581 – foram descobertos pelo HARPS.

“E estamos confiantes que, considerando os resultados obtidos até ao momento, a descoberta de planetas com a massa da Terra em torno de anãs vermelhas está ao nosso alcance,” afirma Mayor.

Mais Informação
Esta pesquisa está apresentada num artigo submetido à revista da especialidade Astronomy and Astrophysics (“The HARPS search for southern extra-solar planets: XI An habitable super-Earth (5 MEarth) in a 3-planet system”, por S. Udry e colaboradores)

A equipa é composta por Stéphane Udry, Michel Mayor, Christophe Lovis, Francesco Pepe, e Didier Queloz (Observatório de Genebra, Suiça), Xavier Bonfils (Observatório de Lisboa, Portugal), Xavier Delfosse, Thierry Forveille, e C. Perrier (LAOG, Grenoble, França), François Bouchy (Institut d’Astrophysique de Paris, França), e Jean-Luc Bertaux (Service d’Aéronomie du CNRS, França)

Notas
[1] Usando o método das velocidades radiais, os astrónomos podem obter apenas o limite mínimo da massa (na medida em que é multiplicada pelo seno da inclinação do plano orbital em relação à linha de visão, que é desconhecida). No entanto, de um ponto de vista estatístico, esta medição geralmente encontra-se perto da massa real do sistema. Dois outros exoplanetas possuem uma massa semelhante. O planeta gelado em torno da OGLE-05-390L, descoberto pelo método das microlentes gravitacionais com uma rede de telescópios, incluindo um em La Silla, possui uma massa (real) de 5,7 vezes a massa da Terra. No entanto, possui uma órbita muito mais afastada da sua pequena estrela do que o planeta agora descoberto e é pois muito mais frio. O outro planeta é um dos que foram encontrados em torno da estrela Gliese 876. Este planeta possui uma massa mínima de 5,89 vezes a massa da Terra (e uma massa real provável de 7,53 vezes a massa da Terra) e completa uma órbita em menos de 2 dias, tornando-o demasiado quente para a existência de água no estado líquido.
[2] A estrela Gl 581, ou Gliese 581, é a entrada nº 581 do Catálogo Gliese, que lista todas as estrelas conhecidas até uma distância de 25 parsecs (81,5 anos-luz) do Sol. Foi originalmente compilado por Gliese e publicado em 1969, e posteriormente actualizado por Gliese e Jahreiss em 1991.
[3] Este método observacional fundamental é baseado na detecção de variações na velocidade da estrela central, devidas à variação na direcção da força gravitacional de um exoplaneta (invisível) à medida que este orbita a estrela. A avaliação das variações de velocidade medidas permite deduzir a órbita do planeta, em particular o período e a distância à estrela, assim como a massa mínima.

Contactos
Stéphane Udry, Michel Mayor
Observatório de Genebra, Suiça
Telefone: +41 22 755 26 11
Email: Stephane.Udry (at) obs.unige.ch, Michel.Mayor (at) obs.unige.ch

Xavier Delfosse, Thierry Forveille
LAOG, França
Telefone: +33 476 51 42 06
Email: Xavier.Delfosse (at) obs-ujf-grenoble.fr, Thierry.Forveille (at) obs-ujf-grenoble.fr

Xavier Bonfils
Observatório Astronómico de Lisboa, Portugal
Telefone: +351 21 361 67 43
Email: Xavier.Bonfils (at) oal.ul.pt